A vida infantil segundo Jacques Lacan – O estágio de espelho, o Desejo da Mãe e o Nome-do-Pai
Segundo Jacques Lacan, ocorre um processo chamado “estágio de espelho” que se inicia aos seis meses de idade até aos dois anos.
Mas, como ocorre esse processo? Num primeiro tempo a criança não teria a vivência do seu corpo com sendo uma parte integrada, pelo contrário ela percebe seu corpo como sendo uma dispersão de partes separadas, por falta de coordenação e imaturidade de como ela vem ao mundo. Assim tendo uma vivência de despedaçamento. De início a criança começa a conquistar a totalidade de seu corpo por meio do “espelho”, que representa uma metáfora do vínculo entre mãe e bebê, do olhar da mãe e do bebê, essa metáfora traz uma dimensão imaginária, na qual permitirá uma ilusão de completude do bebê. É nesse “espelho” que a criança irá antecipar a totalidade de seu corpo, por meio dessa imagem no espelho.
A criança reage diante dessa imagem como sendo a de um outro e depois se dá conta que esse outro é ela própria. A mãe seria o espelho da criança e é ela que contribuirá para visão desse outro. Então, é lá fora que a criança se descobre. Quando a criança se dá conta que esse outro é ela mesma reagirá com júbilo diante dessa imago, o ego ideal, porém, é nessa imagem do outro que a criança irá se alienar. É esse outro que irá assumir o lugar da criança, esse é o campo do Imaginário, o campo narcisista.
Uma identificação com a própria imagem especular como uma ilusão de domínio e coordenação corporal que ainda não foi alcançada, e uma ulterior alienação do olhar da mãe na sua própria imagem. Essa cisão posterior entre ser fragmentado e seu reflexo no espelho, constitui um novo estágio psíquico na dialética da separação/unificação. [...] o espelho tanto duplica quanto cinde, o mundo não é mais uma extensão do bebê, mas está duplicado, o outro se torna o duplo de si mesmo. Esta relação com o duplo sempre provoca conflito, pois, se o outro é um duplo de si mesmo, ele também é um rival. O espelho inaugura uma rivalidade consigo próprio; o objeto de identificação se torna, igualmente um objeto de ódio e agressão (BENVENUTO, 2001 p. 42).
No segundo tempo do Estágio de Espelho, a criança alienada na imagem do outro, imagem dela mesma e do corpo e do olhar de sua mãe, ela irá se identificar com essa imagem e assim se identificando com o desejo desse outro, o da mãe, ele irá desejar o desejo da mãe, ou seja, irá desejar ser o desejo da mãe. A criança acredita que o desejo da mãe é possuir o falo, por conseguinte a criança irá desejar ser o falo da mãe, o falo aqui será entendido como sinônimo de poder.
No terceiro tempo do estágio de espelho, entra em cena o pai com a castração e como portador da Lei, aqui é o momento do advento do Simbólico.
Nesse momento o pai surge com a sua função, o de portador da Lei, de interditar e normatizar os limites da relação diádico-simbiótica da mãe com o filho.
Vemos aqui que Lacan vai assinalar a função do pai, como sendo o significante do Nome-do-Pai, ou seja, não a pessoa do pai, mas a importância que a mãe dá a sua palavra ou ainda a sua autoridade, a um significante do pai, e será assim que os limites a relação diádico-simbiótica mãe-filho irá ser imposta. É assim que o Nome-do-Pai será inscrito no inconsciente da criança e irá intervir no Complexo de Édipo, introduzindo assim a norma fálica para a criança. É assim que irá se organizar a relação mítica e edipiana da família.
A mensagem que o significante Nome-do-Pai traz segundo Lacan não é simplesmente o “não te deitarás com tua mãe”, não simplesmente dirigida a criança, sim um “não reintegrarás o teu produto” que é dirigida a mãe, é essa a mensagem que introduzirá a Lei na relação mãe-bebê.
A aceitação, por parte do filho, dessa castração por parte da lei do pai irá constituir o registro Simbólico, o ingresso no triangulo edípico. Para a criança isso reflete ao “ser o falo para alguém”, e irá fazer a criança ter um desejo próprio e ser guiado por esse desejo, embora não onipotente pela mediação da castração paterna.
Segundo a Psicanálise Lacaniana, poderemos compreender os diferentes lugares que a criança poderá ocupar na estrutura familiar, ou seja, os diferentes lugares que ela ocupa no desejo do Outro, com as possíveis respostas que poderá dar a esse desejo, e quais serão as conseqüências disso na estruturação da criança como sujeito.
REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
BENVENUTO, Bice. Era uma vez: o bebê na teoria lacaniana. In: BURGOYNE, Bernard; SULLIVAN, Mary (Org.). Diálogos Klein-Lacan. 1º edição. São Paulo: Via Lettera, 2001. Cap. 2, p. 29-46.
COSTA, Teresinha. Psicanálise com crianças. Rio de Janeiro: Ed. Jorge Zahar, 2007.
FRANCISCHELLI, Leonardo Adalberto. De onde fala Lacan?. Psique, Ciência & Vida Especial. São Paulo, Ano 1, nº 4, p. 52 – 57.
LACAN, Jacques. Escritos. Rio de Janeiro: Ed. Jorge Zahar, 1998.
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