Para Reich, a maioria dos instintos socialmente perturbadores, como a agressividade, as taras, a violência sexual, não passam de conseqüências de repressão sexual imposta aos indivíduos pela sociedade. A moral repressiva das sociedades autoritárias deforma os instintos sexuais, que acabam se exteriorizando agressivamente e prejudicialmente para a própria comunidade. Nessas condições, amoral repressiva (ou a civilização que esteriliza os instintos de prazer) é a grande responsável pela violência e agressividade da humanidade, e não, como afirmava Freud, uma necessidade de suprimir ou refrear tais instintos.
Na verdade, afirma Reich, a moral repressiva serve menos para represar instintos nocivos à sociedade e mais para atender aos interesses das classes dominantes em manter os seus privilégios econômicos. Evidentemente, à medida em que provoca taras e perversões, a moral repressiva deve tornar-se cada vez mais repressiva para controla-las. Porem, a causa primeira dessas manifestações “anti-sociais” não é a natureza humana supostamente agressiva, e sim a própria civilização repressiva.
Dessa forma, Reich procurava opor-se à concepção freudiana de civilização, onde esta é tida como repressiva em qualquer circunstância. Na verdade, Reich não negava o caráter repressivo da civilização atual, mas apontava para a possibilidade de uma outra não repressiva, isto é, uma organização social onde não houvesse a dominação de homem pelo homem. A civilização repressiva corresponde a uma fase especifica da historia da humanidade e pode ser superada, uma vez que não corresponde a nenhuma característica “natural” e inevitável do ser humano.
Diante desses argumentos, a abordagem freudiana corre risco de tornar-se conservadora e a-histórica, e mesmo justificar a dominação de classe e a sua manutenção, a despeito de Freud ser o grande inspirador da obra de Reich.
Nos primórdios do capitalismo, a moral repressiva deveria facilitar a formação de novos contingentes de trabalhadores, e, assim, o sexo “normal” era aquele restrito à procriação e que não desperdiçasse o tempo e as suas energias que os trabalhadores tinham de guardar para o seu trabalho nas fabricas. Provavelmente por isso, a moral vitoriana exigia decotes fechados e atitudes mais recatadas, e incidia com rigor especial sobre a mulher, a única que poderia garantir a existência de herdeiros consangüíneos para o capital. Então, a fêmea deveria ser mantida em regime de monogamia vigiada, enquanto fechavam-se os olhos, ou, até mesmo, eram incentivadas as “aventuras” masculinas.
A família tradicional inicia o seu trabalho de castração (ou de formação de personalidade autoritária) sobre os primeiros instintos eróticos da criança. Esta fica impedida não apenas de dar vazão à sua atração pelos pais, como também de realizar jogos eróticos com seus amiguinhos, ou mesmo de praticar a masturbação (para os ignorantes pais que acham que isso é um insulto ou sem vergonhice, experimente fazer isso e acabará transformando seu filho naquilo que realmente o pai não deseja: uma criança sem amigos, com tendências homossexuais, carência, submisso, medo do outro, medo de amar, viver sob pressão, transtorno de personalidade, introversão, brigas escolares onde ele sempre sai perdendo, apelidos de mal-gosto, torna-se um esparro, etc.). Assim, a sexualidade vai adquirindo deformações anti-sociais, e criam-se seqüelas que vão se alargando à medida que os indivíduos vão se defrontando com novas interdições sociais.
Na família compulsiva, diz-nos Reich, o pai é o representante máximo da autoridade. Ele é o encarregado de impor aos filhos a moral repressiva e os pontos de vista do status quo.
Essa repressão familiar aleija psiquicamente os indivíduos, bloqueando-os em suas manifestações criativas e afetivas, e dotando-os de uma estrutura mental de vassalo. Isso implica torna-los impotente (ou pelo menos, deformar suas energias sexuais), com medo e submissão à autoridade e, ao mesmo tempo, com uma forte ânsia de exerce-la, de assumir o poder para proteger-se de suas próprias inseguranças. A situação autoritária garante uma certa estabilidade e a existência de pais (primeiro o familiar, e depois as instituições estatais), que dizem o que fazer ao enorme bando de filhos inseguros.
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