Como terapeuta e orientador sexual, há 25 anos, posso concluir que a causa principal dos desajustes sexuais entre casais sobrevem da indolência de um ou de ambos os cônjuges. Este argumento é válido para aqueles casais que outrora foram sexualmente adequados tanto no aspecto afetivo como no biológico propriamente dito e que agora se ressentem em suas ruminações e avaliações silenciosas; preventivamente prefiro não considerar as disfunções sexuais em suas características particulares, principalmente com relação às suas causas remotas. Seria assunto mais adequado para palestras com tempo prolongado e participação ativa dos casais.
Aprendemos com Freud e nos convencemos de que a libido é a energia fundamental do ser vivo, principalmente do Homem. Esta energia é vital para a sobrevivência e se manifesta por meio da sexualidade em seu sentido amplo. Freud referiu a libido como oriunda do instinto de vida e, este, o motivo da existência. O poder da libido é ilimitado e nós podemos utilizá-la convenientemente para diversos fins sem adulterar seus propósitos verdadeiros, embora devamos tomar o cuidado para não investi-la totalmente num único alvo. A sublimação da sexualidade é uma forma de investimento libinal para fins socialmente aceitáveis, porém essa inversão deve ser apenas um empréstimo temporário e restituível brevemente para não acontecer a falência da vida. Um dos primeiros sinais de falência libidinal é a indiferença afetiva - a falta de responsividade aos prazeres, até então existentes, mormente à intimidade sexual. Muitos outros sinais denunciam a estagnação da libido e, entre eles podemos considerar a tendência das pessoas ao isolamento social, a falta de metas, o abandono de si mesmo, a percepção acerbada da vida e a renúncia aos contatos humanos mais íntimos. Entre os casais o contato assume uma distância inalcançável e se mostra presente através das constantes críticas, das animosidades, da anulação do outro e das agressões físicas.
A apatia sexual comum entre casais, principalmente daqueles que convivem há muito tempo, é o retiro protetor do pouco que resta da dignidade pessoal ou do amor-próprio, talvez uma forma sutil de represália para destruir o outro. O relacionamento sexual pode, paradoxalmente, acontecer nestas circunstâncias. Em alguns casais, quando a hostilidade chega ao extremo da tolerância, as relações sexuais se intensificam para dissimular o ódio insustentável à estima dilacerada pelas dissensões nutridas no trato diário. Estes casais normalmente referem suas atividades sexuais como sendo a garantia da convivência, ou sejam, aludem o sexo como condição de compatibilidade e, quase sempre afirmam darem certo "apenas na cama", sem saberem na verdade que este comportamento sexual é produto do infortúnio afetivo crônico - o autêntico relacionamento sádico-masoquista, ou melhor ainda, a libido desvirtuada se sujeitando ao poder da hostilidade recíproca - neste ponto a convevivência está severamente comprometida, irresgatável e destruidora para toda a família. É o extremo que não deveria ter chegado, pois a essas alturas, a terapia de casal ou qualquer outra alternativa são inúteis. Nenhum dos cônjuges consegue ceder a qualquer ajuda, pois isto significaria ser derrotado pelo outro. O que fazer então para prevenir?
Qualquer médico ou psicoterapeuta prefere utilizar de meios preventivos ou educativos que tratar de males já estabelecidos. A prevenção é muito mais eficiente que o tratamento, pois através daquela informamos, orientamos e damos sugestões para experiências gratificantes - a racionalidade é mais utilizada e eficiente quando ainda não se tem elementos perniciosos encravados no sentimento das pessoas.
Um dos pontos fundamentais para um bom relacionamento afetivo-sexual é a comunicação assertiva, onde o casal pode aprender a ouvir, falar honesta e diretamente sem rodeios sobre o que sente e pensa a respeito do outro sem que faça julgamentos pessoais ou projete os rancores sob a forma de agressões verbais. A melhor forma para expressar assertivamente os ressentimentos é falando sempre na "primeira pessoa do singular", ou seja, falando sobre o que sente com relação à atitude do outro - isso, além de proteger o outro em sua dignidade e amor-próprio, impossibilita a oportunidade de retaliações. A submissão da mulher à decisão sexual do parceiro é um aspecto cultural danoso num relacionamento conjugal, pois não se leva em consideração a disponibilidade e a vontade dela. É claro que a mulher sente-se bem ao ser requestada, embora devemos lembrar que compete a ela o poder biológico da sedução - como qualquer outra fêmea no reino animal. O ciclo bio-sexual da mulher tem um propósito único de reprodução e, por isso, seu apetite é ordenado para determinado período do ciclo menstrual, mais precisamente no período fértil do ciclo menstrual regular de 28 dias, ou seja, por volta do décimo quarto dia. O homem porém, não possui estes determinantes cíclicos e a sua espermatogênese só termina com sua morte - é um reprodutor por excelência, cuja função é produzir seres semelhantes para evitar a extinção biológica da espécie - é a lei natural da sobrevivência. Por isso o homem está, instintivamente, sempre predisposto ao ato sexual.
Contudo, as determinações biológicas não podem imperar sobre a racionalidade necessária para a adaptação no ambiente e, por isso, devemos conciliar as forças naturais para a continuidade da vida e as conveniências sociais, econômicas, morais e religiosas. Se não se entende esse fenômeno, o fracasso é a única meta atingível. Ao se instituir o casamento oficial (religioso e/ou legal) o homem e a mulher passaram a buscar o ajustamento à premência comandada pela necessidade natural de reprodução e, foi aí que desenvolvemos a capacidade de amar - forma sublime e inteligente de domesticar as exigências do impulso sexual constante do homem. Perfeito! Algumas pessoas evidentemente não conseguiram evoluir e sublimar seu instinto sexual e se tornaram promíscuos.
Em qualquer relacionamento humano persistente faz-se necessário fazer constantes reformulações, sendo a criatividade neste caso, o principal meio para tornar a convivência satisfatória. A inventividade humana é um dos aspectos mais relevantes da inteligência e, é através dela que se consegue a adequação às mais diversas situações, quer sejam benéficas ou não. Num relacionamento conjugal a criatividade é imprescindível, senão a única forma de tolerarmos a monotonia e os "mesmismos" inevitáveis do dia-a-dia. A relação conjugal não está demarcada simplesmente pelas necessidades sexuais, existem vários fatores que interferem para interceptá-las, sufocá-las, impedi-las ou exacerbá-las.
É difícil coincidir que duas pessoas tenham a mesma carga de erotismo. Para algumas pessoas o sexo é essencial para a sua vida, enquanto que para outras ele é apenas um acessório do contexto biológico. Para muitas pessoas, entretanto, seus desejos sexuais não são constantes, mas se revelam através de várias alternativas. Para outras a freqüência sexual obedece intervalos prolongados, porém com muito colorido erótico e satisfação inusitada. Em suma, cada pessoa possui um ritmo erótico peculiar, idiossincrático. O mais importante, contudo, é a adequação entre os parceiros sem que um se sinta coagido pelo ritmo do outro e se submeta incondicionalmente ao interesses dele.
A maioria dos casais fica na expectativa dos sinais biológicos deflagrados pela necessidade sexual natural, ou seja, aguarda as determinações cíclicas do desejo sexual procriativo. Não procura desenvolver nenhuma cerimônia erótica, pelo contrário, se afasta porque a lâmpada verde está apagada e não se acende sozinha. Não faz nada para acioná-la. Esta é uma das razões da apatia - o afastamento por indolência afetiva.
O erotismo em seu sentido amplo, é na verdade o interesse pela outra pessoa. Ele está implícito nas trocas intelectuais, emocionais, na capacidade de envolvimento, na dedicação e no desprendimento. O erotismo é uma das manifestações de liberdade mais evidentes e saudáveis do ser humano. É somente através do erotismo que a pessoa consegue desapegar do egoísmo e se confundir e assimilar o amor recíproco. O melhor caminho é o encontro físico dos contatos que, daí, deflagram os mais enlevados sentimentos de onipotência.